sábado, 21 de maio de 2011

Dominatrix Sem Chicote

Por Boris Y.


O post do dia 14 de maio, como sempre muito bem escrito pelo Dr. Onofre, tratou da difícil missão de se substituir o João Ximenes Braga no caderno Ela do O Globo. Eu li todos os livros do João Ximenes e sinceramente o melhor deles é a Dominatrix Gorda, que nada mais é que uma compilação de algumas das colunas publicadas no jornal e que tratam, sobretudo, da Cidade do Rio de Janeiro.

"A beleza do Rio é composta por uma sucessão de atos de violência sexual. Você está lá, saindo do Rebouças para descer o Cosme Velho, e o Largo do Boticário sai de uma emboscada e lhe dá um tapa na cara. Ou, pior, sai do túnel na outra direção e a Lagoa o estupra. Você anda pelos horrores de edifícios empastilhados de Copacabana quando um prédio art déco põe o pé na sua frente e você tropeça e cai de cara no chão. O Rio é uma dominatrix gorda" (JXB)

Não é que todo o carioca goste de pissing, mas todo carioca que ama o Rio vive com a cidade uma relação sadomasoquista. Afinal de contas o SM se baseia nessa ambivalência de dor/prazer e tensão/alívio, que é um retrato do que costumava ser a vida carioca até uns poucos anos atrás.

Pois é, costumava, essa Dominatrix não está mais tão adepta assim do SM, o Rio está dando menos tapa na cara, amarrando com menos força, tá estuprando sem brutalidade. Parece que a Dominatrix, embora continue nos estuprando com a sua beleza, perdeu o chicote.

Semana passada eu finalmente me senti novamente violentado, estuprado pela Cidade vestida de couro preto brilhante. Eu, que sou usuário do metrô, indo do Centro para faculdade, peguei como sempre a “integração Gávea” e sem espaço no ônibus lotado me vi obrigado a ir em pé ao lado do motorista. No caminho fui observando tudo pelo vidro da frente, mas para quem pensa que as confusas e engarrafadas ruas de botafogo são uma vista ruim... lá aparece o Cristo Redentor e todo o Corcovado bem no meio da São Clemente ao entardecer com a estátua iluminada em amarelo (pela paz no trânsito).

Mas não foi a vista do Corcovado sobre o a igreja do Colégio Santo Inácio que me espancou, como eu disse anteriormente, numa relação SM é preciso dor e tensão para termos o gozo. A chicotada foi abrir o site do O Globo quando eu cheguei em casa e descobrir que naquele mesmo dia tinha ocorrido um arrastão no metrô que eu acabara de pegar e utilizaria também no dia seguinte. Estava de volta a tensão, o risco, saber que andar de ipod em punho no metrô era menos seguro do que eu vinha supondo. Medo, sabor das décadas passadas, no tempo em que a mesma São Clemente era tomada por pivetes que saiam do Dona Marta. Sem falar dos tiroteios desse mesmo morro agora pacificado, me lembro até de ficar deitado no chão da sala nos meus tempos de CSI.

As UPP’s estão deixando as ruas mais seguras, o progresso econômico está tirando mendigos e menores das ruas e substituindo as lojas fechadas pela violência por imponentes grifes, portarias reformadas e suntuosas, Chevetes dão lugar a Porches, kit-net em Copacabana vale ouro e assim a Dominatrix perde o seu chicote. A beleza ficou, mas sumiu a desgraça (ou será a graça?).

Sentir o medo e a tensão novamente foi, de certa forma, tão gostoso quanto nostálgico e se para o gênio Nelson Rodrigues "nem todas mulheres gostam de apanhar, só as normais" é possível dizer também, por analogia, que nem todos os cariocas gostam de apanhar, só os legítimos.

Bate que eu gosto Rio! Mais forte!

Nota: Não estou criticando os progressos que o Rio vive, pelo contrário, fico muito feliz que a Cidade esteja melhorando, contudo, apenas quis falar sobre um sentimento ambivalente e felizmente nostálgico.

5 comentários:

  1. Interessante, não moro no RJ mas tenho visitado pq meu namorado mora.
    A minha mãe, que não conhece a cidade, pensa que a violência e o medo são constantes. Que a gente vê assalto a torto e a direito.
    Pois eu me senti mais segura do que na minha própria cidade.
    Pois é, a imagem que tenho do Rio mudou completamente pra mim. Legal ver a de um morador que não se sente ofendido quando o tema é a violência da cidade maravilhosa.

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  2. Caí aqui sem querer. Intessantes, teus relatos.

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  3. Todas as cidades possuem problemas. Fica impossível citar apenas o Rio de Janeiro. Basta andar por SP, POA, BH e várias outras grandes capitais e encontrar problemas similiares e em alguns casos até piores.
    Bom domingo.

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  4. Aqui em Recife nem se fala, a violência tá absurda e o sangue tá dando na canela. Bom relato esse seu sobre o Rio. Parabéns pelo post.

    Abração pra ti.

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  5. Vejo que está melhorando sim, porém, acredito que com a legalização das drogas, isso puxaria o tapete dos traficantes, diminuindo a criminalidade, e consequentemente afetando políticos que participam de certos esquemas.

    Ainda penso que o raciocínio de que o povo brasileiro não esta preparado para uma reforma na política de Drogas é ultrapassado...

    A proibição de drogas só beneficia traficantes e policiais corruptos.
    No processo da mudança que enxergamos a evolução.

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